No início de 2020 fomos procurados por um cliente, com atuação na fabricação e comercialização de máquinas industriais, para resolução de problema de inadimplência que estava tirando o sossego dos gestores e impactando consideravelmente o fluxo de caixa da empresa, ocorrência que aliada ao cenário pandêmico, poderia acarretar o encerramento das atividades da empresa de forma abrupta.
A empresa havia fechado uma venda milionária de equipamentos com uma empresa – concessionária de serviços públicos – e para garantir o negócio foi incluída propositadamente no contrato de compra e venda – elaborado minuciosamente por nosso escritório – cláusula com reserva de domínio, a qual autorizaria a retomada imediata do bem pelo vendedor em caso de inadimplemento de qualquer parcela.
Contudo, passados poucos meses depois do fechamento do negócio a empresa compradora do equipamento passou a não mais efetuar o pagamento das parcelas mensais, situação que fez a empresa vendedora procurar linhas de crédito para custear despesas básicas como pessoal e fornecedores.
Buscando amigavelmente resolver o conflito ocasionado pelo inadimplemento contratual, nosso escritório elaborou 02 (duas) notificações extrajudiciais via cartório, uma endereçada à devedora oferecendo-lhe a chance de quitar a dívida em aberto com os encargos contratuais ou devolver o maquinário e pagar quantia pela depreciação pelo uso do bem, e outra endereçada ao ente municipal responsável pela concessão dos serviços realizados pela empresa devedora, com vistas à retenção dos repasses mensais à devedora no montante da dívida contraída junto à cliente, sob pena de responsabilização solidária da cessionária.
Para dar robustez ao ato e deixar claro para a empresa devedora que estávamos dispostos a lutar pela reversão do cenário financeiro injustamente experimentado por nosso cliente, bem como pela manutenção deste no mercado, efetuamos o protesto das duplicas virtuais e, em poucos dias, a empresa devedora experimentou uma série de restrições financeiras que impactaram suas operações.
Sem qualquer fundamento plausível a empresa devedora apresentou resposta a nossa notificação numa espécie de “cortina de fumaça” questionando várias cláusulas contratuais, sem, contudo, oferecer uma solução efetiva para o problema ocasionado por si.
Nesse meio tempo tomamos conhecimento acerca da recente abertura de pedido de falência por parte da empresa devedora e das chances de sucateamento e/ou ocultação do bem, o que poderia ensejar a frustração da nossa ação que tinha como objetivo recuperar a máquina. Assim, recalculamos os possíveis caminhos para resolução do problema de forma assertiva e célere, mitigando ao máximo os riscos e prejuízos financeiros que o cliente poderia sofrer.
Verificando a fragilidade dos argumentos trazidos pela empresa devedora em sua contranotificação e, cientes do instrumento contratual bem amarrado que tínhamos em mãos para amparar nossa pretensão, propusemos ação judicial visando à recuperação da máquina, bem como a cobrança de valores previstos no contrato na hipótese de descumprimento. Na sequência da distribuição da ação agendamos reunião com o juiz do caso para tratar dos pontos sensíveis da demanda.
Dentro de exatos 02 (dois) dias tivemos a decisão liminar em nosso processo determinando a devolução imediata da máquina, com autorização para o uso de força policial.
Temendo possível déficit em sua produção com a entrega da máquina, a empresa devedora recorreu da decisão liminar argumentando que a retomada do maquinário implicaria na inviabilização do cumprimento de atividade pública essencial aos cidadãos e, ainda, que o bem em questão estaria afetado à concessão, pertencendo, desse modo, ao município cessionário.
Em atenção ao princípio da continuidade do serviço público militante em favor da concessionária, que neste caso beneficiaria a empresa devedora, foi deferida em caráter provisório pelo tribunal de justiça a suspensão da decisão que determinou a devolução da máquina ao nosso cliente até o julgamento definitivo do recurso.
Incansáveis e focados em nossa fundamentação e no amplo acervo de provas, questionamos todos os argumentos da empresa devedora demonstrando que os fundamentos trazidos por ela eram frágeis e incabíveis à situação.
Por entendermos a relevância das questões envolvidas e a necessidade de nos fazermos entender pelos julgadores, novamente fizemos contato requerendo uma oportunidade para explanar o caso junto ao tribunal e pugnar pelo desprovimento do recurso movido pela empresa devedora.
Assim, de forma brilhante o tribunal de justiça estadual reconheceu a necessidade de manutenção da decisão liminar que autorizou a devolução da máquina em favor de nosso cliente e, imediatamente, tomamos todas as providências necessárias para buscar a máquina no local em que ela se encontrava.
Dentro de poucos dias a máquina foi devolvida ao nosso cliente e já aproveitamos o gatilho para pedir ao juiz que fosse autorizada a realização de perícia e avaliação da referida máquina para fins de ressarcimento por eventuais avarias, bem como que fosse autorizada a venda do bem de imediato para que este não viesse a perder valor de mercado.
Nossos pedidos foram acolhidos pelo juiz, a venda foi autorizada e a perícia foi realizada de forma rápida. Nesse ínterim, a parte contrária apresentou defesa, oportunidade em que impugnamos todas as teses trazidas pela empresa devedora exaustivamente, repisando por “a mais b” o porquê a ação deveria ser julgada completamente procedente em favor do nosso cliente.
Antes da sentença no caso, foi feito contato estratégico com os advogados da empresa devedora, visando a exposição dos riscos a que estaria incidindo com a continuidade da demanda, bem como para o oferecimento de proposta de acordo consistente na manutenção da posse e propriedade da máquina em favor do nosso cliente em caráter definitivo, confissão de dívida e pagamento de quantia de cunho reparatório e das despesas processuais pela empresa devedora.
Entendendo ser o mais racional para aquele momento e buscando minimizar prejuízos financeiros da empresa devedora, houve o aceite de nossa proposta de acordo em sua integralidade, inclusive as penalidades contratuais na hipótese de inadimplemento ou atraso no pagamento, e foram pagas todas as parcelas devidas dentro dos prazos estabelecidos até a quitação da dívida por completo.
Atingimos, assim, dentro de 11 (onze) meses, nossos objetivos com a demanda que poderia demorar por volta de 5 a 10 anos se tramitasse judicialmente. Nossos objetivos nesse caso eram promover a continuidade da operação do nosso cliente com a entrada de valores mensalmente no fluxo de caixa pelos prejuízos materiais suportados de forma ampla e a garantia de que a máquina ficaria com ele em definitivo, podendo este usar e dispor do bem livremente. Conseguimos, portanto, em pouco tempo, um benefício econômico superior a 1 MM de reais em favor do cliente por termos tomado estratégias assertivas, tanto na esfera judicial quanto na extrajudicial, para a resolução do caso.
Se desse case de sucesso do escritório pudéssemos tirar algumas lições aplicáveis para todas as empresas clientes, certamente elas seriam:
- Foque na dor de sua empresa e coloque muita energia para acabar com ela;
- Esteja sempre amparado por bons instrumentos contratuais;
- Tenha um time de profissionais multidisciplinar que trará uma visão mais estratégica para o seu negócio – invista nisso;
- Analise e suavize os riscos com base em todas as possibilidades. Ter boas estratégias, executá-las e, se houver imprevistos, recalcular novas rotas, é fundamental;
- Fique atento para resolver conflitos e negociar (dentro e fora do processo) e busque a ajuda de profissionais com essa expertise que não estejam emocionalmente envolvidos com a situação;
- Não desista do objetivo mesmo diante dos contratempos, una suas forças e vá à luta; a vitória para aqueles que trabalham com foco, técnica e paixão é consequência.
AUTORA:
Ketlin Willms Fuhrmann Brum
Advogada, graduada pela Universidade Tuiuti do Paraná em Curitiba/PR. Atuação nas áreas do Direito Civil, Direito Processual Civil, Direito Empresarial e Direito Tributário. Especializada em Negociação e Administração de Conflitos pela FGV/RJ. E com formação em Governança Corporativa para Empresas Familiares pelo IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.